domingo, 28 de março de 2010

A Bola.

A vida não é fácil pra ninguém, mas cada um tem seu jeito de lidar com ela. Algumas maneiras são saudáveis, outras não.
Pra ela nunca foi. Ela não sabe respirar fundo, meditar, ter um papo amigável com a terapeuta ou com um amigo. Pra ela, é aquela bola. Aquela bola que cresce dentro dela e começa a tirar o ar. Uma bola de poder como dos Super Sayajins, que, aliás, se parecem muito com a configuração física que ela carrega hoje. A bola de poder cresce, cresce e toma conta dos outros sentimentos e dos outros acessos à comunicação que um corpo carrega. Ela fica surda, ela fica cega e ela espera, pacientemente, enquanto a bola a sufoca, pra dar fim a este sentimento.
Um pedaço de vidro quebrado. Ela sempre soube onde guardar, é só dela, de mais ninguém e é impossível de ser encontrado senão pela bola iluminada.
O vidro desliza sobre a pele, com ódio, com força, com tudo o que a bola carrega e a faz ser assim, cheia de poder. Solidão, medo, desprazer, insegurança, tudo! O vidro usa a força da bola magnética e desliza sobre a pele macia, sobre a pele que um dia ela cuidou com cremes, body splashs e perfumes, com filtro solar pra não manchar, com banho de lua pra ficar lindinha. O vidro ignora tudo isso, a bola, que segura o vidro, que comanda o vidro, também. Faz cortes de todos os lados, faz arranhões, escreve aquilo que ela sente e marca na pele. Um dia já foi raiva, desta vez foi “Unloveable”. É assim que ela se sente. Ela e a pele cheia de cremes caros hoje se sentem assim: indignas de serem amadas.
A bola se desfaz num suspiro profundo de alívio. E vai embora, deixando ali as marcas que ela vai ter que explicar ao Universo onde ela pertence, as marcas que vão doer no banho, as marcas que fazem, algumas pessoas chorarem e outras pensarem que ela é apenas uma adolescente tardia tentando chamar a atenção.
Só a bola é capaz de compreendê-la, só o suspiro aliviado de quando a bola se desfaz é que justifica cada minuto, cada ato, cada pedaço de vidro.
“Um dia isso vai acabar”, ela pensa. Mas cada dia a bola ganha mais poder e se torna mais assustadora. Um dia, talvez, ELA vá se acabar... Nisto sim, ela acredita.