segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A louca.

Confesso que senti um pouco de saudades dela. Da louca e da dor que a dá à luz. Uma vida cor de rosa e ensolarada, 24 por 7, nunca foi algo que combinou muito comigo. Conheci alguém incrível com quem tenho convivido, gratamente, dia a dia, alguém que eu ainda quero me tornar quando alcançar sua idade, alguém que é um pouco meu espelho, um pouco meu oráculo. Identificação absoluta e imediata, colo deliciosamente familiar e confortável. Alguém que me lembrou, em meio ao turbilhão do momento, que tudo na vida vem para aprendermos algo. E eu aprendi: a louca ainda existe. Ela só precisa do estímulo correto pra pular do meu peito, mostrando todas as carreiras de dentes e garras afiadas, com a face esverdeada, toda descabelada. Os olhos vermelhos, de pupilas dilatadas, vidradas, trêmula. Descontrolada, indomável, impulsiva, alimentada pelo sentimento preferido do ser humano: o amor. Quando ela sente esse cheiro, forte e impregnativo, ela se remexe dentro de mim. Minha parte sábia acaricia seus cabelos ressecados e a pede calma. Ela não sabe o que significa esta palavra. Então eu expulso o amor, a paixão, o gostar, o encantamento e qualquer um destes sentimentos que a alimentam vorazmente. Então ela dorme, tranqüila. E me convence, maldosamente, de que não existe. Mas desta vez eu errei. Permiti-me inebriar pela droga mais pesada do mundo. Deixei que uma gargalhada imensa e cheia de vida abrisse uma porta, até então, fechada em meu peito. E como no alçapão de Diane Arbus, dei espaço em minha casa para anões, mulheres barbadas, homens de quase 3m de altura e Lionels diversos. Abracei o sorriso fácil, a rudeza, que ficava tão bonita aliada à delicadeza no trato comigo, o carisma encantador de multidões que fez, não com que eu me apaixonasse, mas que abrigou uma legião de fãs e admiradores. Fui desarmada, pouco a pouco, por todas as formas de carinho demonstradas e pela inteligência emocional tão admirável em dias como os nossos. Ele sabia o que estava fazendo. Apostou comigo, seu carro predileto (que, por mais estranho que pareça, tinha uma personalidade própria e era igualmente encantadora, com um nome -sim, o carro tinha nome- muito apropriado: "psicopata".) apostou meu coração endurecido. Disse que eu a ganharia se não me apaixonasse por ele. Eu ri, muito. Eu jamais me apaixonaria por ele. Homem mais velho, de uma aparência nem um pouco colaborativa (convenhamos, gosto de menininhos tatuados), peão de rodeio, o exato antônimo do meu rock 'n roll pulsante, com duas ex-esposas, quatro filhos, e tantos poréns. Eu ri, claro! Sempre tão dura, resistente, dona do controle dos meus sentimentos, eu só poderia rir. Então, debaixo daquela casca dura de brutalidade, brota um garotinho, carente e assustado, que me olha com os olhos da minha cadelinha resgatada das ruas, que me toca, me abraça e me beija de uma forma que eu nunca havia sido antes, que me ensina a "fazer amor". Eu, que sempre ri da expressão, que sempre tratei sexo como "trepa", aprendi a fazer amor. Aprendi o que é estremecer apenas ao sentir uma pele tocando a outra, aprendi a dizer "eu te amo" no momento em que, geralmente, eu falaria um palavrão. Lembrei do significado da expressão "borboletas no estômago" apenas ao ouvir o ronco da "psicopata" ao longe. E a voz dele... Essa voz, poderosa, que prende a atenção de 10, 20 mil pessoas por horas, passou a me hipnotizar por completo. E despertou a louca. Com toda a voracidade de quem estava no calabouço há 7 anos, este número cabalístico, ela despertou no dia 2 de setembro, outro número cabalístico: a data em que ela, se não nasceu, firmou-se como parte integrante e perigosa da minha personalidade frágil e inconstante. Sem nenhum resguardo, sem medo, sem controle, ela voou para fora de mim e atacou, feroz e muito bem alimentada por todo esse sentimento poderoso, o objeto do meu amor. O objeto doce e paciente do meu amor. O objeto que me tratou, mais do que qualquer outro, com todo carinho, paciência e respeito que eu merecia. A louca não entende isso. A louca precisa de mais, e ela busca mais, sem nenhum tipo de racionalidade. Ela atacou o meu amor. E ele não resistiu. Morreu. Deixou-me, sabiamente, pois não podia conviver com ela. Nem eu posso, eu o compreendi. Agora tomo painkillers para a alma. Todos, qualquer um. Tento amenizar este buraco que ela deixou no me peito. Sempre fui uma comedora de corações, já estava mesmo na hora de comer o meu próprio. Dói. Mais do que eu imaginei. Mas eu aprendi que o amor não foi feito pra mim, a louca não sabe viver com ele, ela é insaciável. E monstros insaciáveis precisam ficar presos em masmorras pra sempre. Peço perdão aos meus dois lindos e absolutamente tristes 2 de setembros da vida. Hoje somos só nós duas, eu e a louca, disputando espaço dentro desse self tão desconfigurado que sou obrigada a assumir, engolindo a seco esta solidão voraz que ela traz, sempre consigo, como fiel escudeira.

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