domingo, 23 de janeiro de 2011

Diálogo

- Você tá chato!
- Eu tô chato?
- Tá, mais chato que o normal!
- Quer dizer que eu sou chato?
- Um pouco...
- Então eu tô chato?
- Você tá estranho.
- Tô, tô um pouco mesmo. Coisas, muitas coisas...
- Que coisas? Quer conversar?
- Eu não sei, eu não sei. Eu não sei que coisas, eu não sei de nada!
- Você sabe, só não quer falar.
- Não, não sei! Não posso não saber de alguma coisa?
- Pode, ué! Tá...
- Tá... Que estranho.
- O quê?
- Essa sensação...
- O que você está sentindo?
- Eu não sei!
- Tá bom!!!
...
- Conversa estranha...
- Nada!
- Foi sim...
Ele diz e abaixa os olhos... Ri um pouco nervoso, mexe nos cabelos encaracolados e volta a fazer a cara de “não sei!”.
Ela, com um cigarro e um ar blasé, começa de novo a conversa.
- Família?
-Não, não... É que eu acho que perdi minha essência!
- Como assim? Desde quando?
- Desde que saí da casa da minha avó.
- Isso não acontece, ninguém perde a essência em uma semana, meu bem!
- Eu perdi a minha, aconteceu comigo...
- Você não precisa de ninguém pra sustentar sua essência, você tem que se bastar e eu sei que você se basta, tá tudo aí com você!
- É... – e enche aqueles olhos, de cílios enormes, de lágrimas contidas.
Ela levanta, senta-se ao lado dele e o acolhe nos braços, preocupada, acariciando os cachinhos.
- Eu tô com medo de não saber quem eu sou, eu tenho uma decisão pra tomar e... Eu sou um cara indeciso!
- Uma decisão é sempre difícil pra todo mundo...
- Tem os dois lados da moeda.
- É... decisão séria?
- Sim! A partir do momento em que eu decidir, minha mente pode se abrir para uma nova realidade e eu posso nunca mais voltar a ser quem eu era... Eu não sei se quero ser outra pessoa!
- Entendo bem de se abrir para o novo. Eu mesma, cética, atéia e realista, já fui evangélica!
- Você? Jamais! Não combina com a sua alma!
- Não mesmo! Não sou mais. Viu? Experimentei e volte, as coisas podem ser assim! Não quer conversar sobre essa decisão?
- Não, ela está numa caixinha... Se eu começar a falar sobre ela, começarei a ver coisas boas nisso e não quero ver! Vai se tornar muito real... Deixa lá.
- Eu entendo... Entendo mesmo.
- Tenho me sentido muito bonzinho, muito maleável e eu não sou assim! Deve ser esse cabelo... Com cabelo curto eu passei no vestibular, agora...
- Pare de bobagem, garoto! Seu cabelo é lindo e não tem nada a ver com vestibular!
- Ah, é? Eu tenho cara de quê?
- De fofo, de neném.
- Então, não quero mais ter essa cara! Quando eu olho pra você, vejo sua personalidade, você vê a minha quando olha pra mim?
- Não, é preciso conversar com você...
- Então!!! Vou cortar esse cabelo, vou acabar com essa cara de anjo!
- Tá!
- Tá?
- Sim, tá.
- Pq?
- Corta o cabelo!
- Era isso! Pronto, viu? Consegui falar.
- Era isso? Seu drama pessoal eram seus cachos?
- Sim! – sorriso enorme.
- Então corta, garoto, corta agora esse cabelo!

2 comentários:

Anônimo disse...

parecia que eu tava lendo um texto do Caio F.
voce manda muito, como sempre
beijo amiga, força.
raquel

Anônimo disse...

Tô com saudades de suas histórias e casos com outras gurias! São muito inspiradores e fico encantada de lê-las.

bjs
Mariana